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João Luis dos Santos

Publicado aos sábados

31/01/2020

Recessão, neoliberalismo e abandono da sociedade salarial                                                                                   

(artigo do economista e professor Márcio Pochmann)

 

“A geração líquida de 644 mil novos empregos assalariados formais em 2019 foi um alento frente ao mar do desemprego e subocupação que transborda no país desde 2015. Ao mesmo tempo confirma o sentido geral pelo qual o mundo do trabalho encontra-se submetido pelo contexto mais geral imposto pela recessão econômica associada ao processo de desregulamentação das relações entre o capital e o trabalho. Isso porque é com a recessão econômica que o mundo do trabalho tem sido exposto mais rápida e profundamente a mudanças que alteram a trajetória do seu funcionamento. Das três maiores recessões que contaminaram o Brasil desde 1980, a que ocorreu entre 2015 e 2016 foi a mais radical devido aos impactos diretos e indiretos das reformas desregulatórias do trabalho adotadas nos governos Temer e Bolsonaro”.

 

Trajetória histórica

“Ao se defrontar com período de tempo mais longo, como o das últimas quatro décadas, pode-se observar como o mundo do trabalho tem seguido trajetória inversa daquela instalada desde a década de 1880, quando o país rompeu com quase quatro séculos de escravidão. Ou seja, o abandonado das tendências históricas de assalariamento dos postos de trabalho e de formalização do emprego salarial, pelo menos desde a década de 1920, com a implantação da previdência social (Lei Elói Chaves, em 1923) e do trabalho formal (Consolidação das Leis do Trabalho, em 1943).Isso parece inegável quando analisado com rigor o conjunto de dados do mundo do trabalho divulgados pelo IBGE e Ministério da Economia (Rais e Caged). Na comparação das três últimas recessões, por exemplo, a mais recente tem sido a que mais tornou evidente a mudança estrutural sem paralelo nas treze últimas décadas”.

 

Desassalariamentos

“Nas recessões experimentadas em 1981-1983 e em 1990-1992, o mundo do trabalho foi significativamente abalado, porém sem convergência entre as trajetórias do assalariamento e da formalização. Apesar do crescimento do desemprego e do desassalariamento na primeira recessão, logo no início da década de 1980, o Brasil conseguiu retornar o estoque do emprego assalariado, mas sem voltar imediatamente ao nível de formalização durante a recuperação econômica. Em 1985, por exemplo, cinco anos após o começo da recessão, o emprego assalariado era 31% superior ao ano base de 1980, anterior ao início da recessão, enquanto a formalização havia crescido 13,5% no mesmo período de tempo. Com isso, a taxa de assalariamento (relação dos empregos assalariados no total das ocupações) entre os anos de 1980 e 1985 subiu 6,2%, enquanto a formalização dos empregos assalariados caiu 13,2% no mesmo período de tempo”.

 

Recessões sem controle

“Na segunda recessão, logo no início da década de 1990, o desemprego e o desassalariamento reapareceram fortemente. Com a recuperação econômica, o emprego assalariado e sua formalização voltaram a apresentar trajetórias distintas. Apesar do estoque de emprego assalariado em 1994 ter sido 2% superior ao ano base de 1989 (imediatamente anterior ao início da recessão) e o assalariamento formal 4,6% maior, a taxa de assalariamento caiu 11,2% e a formalização dos empregos assalariados subiu 2,7% entre 1990 e 1994. Por fim, na terceira recessão ocorrida no início da segunda metade de década de 2010, o assalariamento e a formalização dos empregos registraram trajetórias de retração convergentes. No ano de 2019, por exemplo, cinco anos depois do início da recessão, o estoque dos empregos assalariados encontrava-se 2,6% inferior e o emprego formal 4,1% menor ao de 2014, o que significou a queda em 2,7% na taxa de assalariamento e a regressão em 2,6% na formalização dos empregos assalariados entre os anos de 2014 e 2019”.

 

Receita neoliberal

“A combinação da recessão econômica com aplicação do receituário neoliberal para desregulamentar as relações entre o capital e o trabalho tem excluído fortemente o conjunto dos trabalhadores do sistema de assalariamento em curso desde 1889. Também termina por alijá-los dos mecanismos existentes de garantia dos direitos à proteção e à promoção social e trabalhista instalados progressivamente desde a década de 1920 no Brasil. A sociedade salarial sonhada por tantos progressistas e posta em prática com as lutas desde os abolicionistas na década de 1880 e dos tenentistas nos anos de 1920 sofreu forte impacto nas três últimas recessões econômicas. Mas tem sido os anos após 2014 – com recessão sem recuperação econômica sustentada, associada ao programa de desregulamentação do trabalho dos governos Temer e Bolsonaro –, a principal imposição destrutiva ao estatuto do trabalho no Brasil”. (Artigo do economista, professor e pesquisador da Unicamp, Márcio Pochmann)

 

Coronavírus

A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou, nesta quinta-feira (30), que o novo Coronavírus é emergência de saúde pública de interesse internacional. “Devemos lembrar que são pessoas, não números. Mais importante do que a declaração de uma emergência de saúde pública são as recomendações do comitê para impedir a propagação do vírus”, disse o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus. Apesar disso, o ex-ministro da Saúde e deputado federal Alexandre Padilha (PT) não considera que seja um momento para pânico e avalia que, apesar do desmonte praticado pelo presidente Jair Bolsonaro, o Brasil está preparado para a eventual chegada do Coronavírus. “Bolsonaro despreza diariamente o Sistema Único de Saúde e os organismos multilaterais como a OMS. Mas é exatamente a capacidade de fusão e articulação entre a agência da ONU e o que construímos ao longo de uma década no SUS que podem evitar uma tragédia do coronavírus no Brasil similar ao que aconteceu na China”, explica.

 

santos.joaoluis@yahoo.com.br

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